sexta-feira, 22 de junho de 2012

Denúncia é arma na luta contra exploração sexual infantil

O símbolo da ‘rainha dos baixinhos’ surtiu efeito maior do que qualquer campanha de divulgação relacionada aos serviços de proteção às vítimas de abuso sexual infantil. As denúncias de violência sexual dobraram depois da declaração da apresentadora Xuxa Meneghel, em rede nacional de televisão no mês de maio, admitindo ter sofrido abuso mais de uma vez na adolescência.]


Na segunda-feira após a veiculação do programa, o Disque-Denúncia Nacional (Disque 100) teve as linhas congestionadas de pessoas revelando casos recentes e outros guardados por anos na memória das vítimas.

Casos de abusos sexuais contra crianças e adolescentes, como os sofridos pela apresentadora, são comuns, e as denúncias aumentam a cada ano. Nos quatro primeiros meses de 2012 o aumento foi de 30 mil ligações, sendo 11% sobre violência sexual contra crianças dentro do lar. O que significa um aumento de 71% em relação ao mesmo período do ano passado.

O abuso sexual afeta 15% dos 65 milhões de menores de 18 anos no Brasil, sendo que 6,5 milhões destas agressões são contra meninas. Porém, um estudo financiado pela Organização Panamericana da Saúde (1994), mostra que somente 2% dos casos de abuso sexual contra crianças e adolescentes dentro da família são denunciados à polícia.

“Infelizmente o número de casos vêm aumentando ou eles passaram a ser comunicados de forma mais consistente e isto dá impressão de que houve aumento. Talvez antes não houvesse tantas denúncias”, disse o coordenador do Conselho Tutelar de Tapejara, Itamar dos Santos. Segundo ele, com o aumento de campanhas de incentivo à denúncia, há um ambiente favorável a que se fale sobre os abusos.

Somente em 2012, o Conselho Tutelar do município registrou 06 denúncias de suspeita de abuso sexual. Em uma delas, que ainda está sob investigação, o pai e o irmão são suspeitas de abusar de uma menina de 13 anos. “Há indícios de que ela sofre violência sexual desde os 9 anos e, possivelmente a mãe é conivente”, disse. Casos como este chegam ao Conselho Tutelar que, primeiramente analisa a situação, visita a família e encaminha aos órgãos responsáveis. “Comunicamos a polícia e encaminhamos as vítimas para tratamento médico e psicológico”, explicou o conselheiro. Na maioria dos casos é determinado que o agressor se afaste da família durante a investigação.



A violação silenciosa

Infelizmente, a prática de abuso sexual infantil é comum e silenciosa. Na maioria das vezes, o abuso ocorre no contexto de uma relação afetiva entre o autor (geralmente o pai ou algum parente) e sua vítima (geralmente a filha). Ainda que os pais eduquem seus filhos orientando-os a desconfiar de estranhos, a prática do abuso é certamente realizada por alguém que a criança conhece, confia e ama e essa relação, cercada de segredos, facilita o domínio perverso sobre a criança.

O abuso sexual normalmente não deixa marcas físicas, já que o abusador age sem violência, usando de sedução e ameaça, o que faz com que a vítima tenha medo da revelação e suporte a violência.

“O abusador sempre age na base do segredo e na combinação do silêncio com a vítima. A maioria dos casos não acontece de forma extremamente violenta como se fosse um estupro. Por isso que toda investigação é feita com o acompanhamento constante de psicólogos”, explica Itamar. O que não significa que a vítima tem culpa por “permitir” o abuso, complementa.

Na avaliação de Jane de Souza, que atua nos grupos de estudos de Educação Infantil e Relações de Gênero da Ufrgs, o abuso sexual infantil não é necessariamente uma questão de pessoas vitimadas ou doentes. “É comportamental. Está relacionado à educação dos homens. Dos homens, porque a maioria dos casos o homem é o agressor.Temos uma educação muito machista onde a eles é permitido fazer tudo, inclusive na prática sexual. Se criam meninos sem limites e homens também. Dentro da lógica de que a experimentação sexual é vasta e permite explorar os corpos, sejam eles quais forem, para sua prática”, defende. E faz uma distinção: “Tem que se ressaltar que é uma prática de heterossexuais porque há um preconceito absurdo de que somente homossexuais seriam abusadores e é um equivoco grande”.

A professora observa também um segundo aspecto necessário para compreender sobre o tema da violência sexual infantil: a falta de proteção das famílias às crianças. “Os pais conseguem instruir para situações perigosas como brincar com fogo, não falar com estranhos e não atravessar a rua correndo. Mas não conseguem explicar de forma tranquila e clara para as crianças que existem comportamentos de adultos que não podem ser praticados com elas”, compara.



Denúncias

A maioria das denúncias que chega ao Conselho Tutelar de Tapejara, seja de abuso sexual ou outros crimes contra a criança ou o adolescente, são anônimas. E todas são investigadas.

Em 2012 foram registradas 36 denúncias referentes a infrequência escolar; 16 denúncias de maus-tratos; 38 de negligência; 06 de abuso sexual; 114 notificações; 90 visitas e 364 atendimentos diversos que consiste em: acompanhamento em internações, Delegacia, solicitação de atendimento psicológico, entre outros.

O coordenador Itamar explica que é muito importante que a comunidade esteja atenta ao que acontece com as crianças e adolescentes e denuncie quando perceber qualquer tipo de abuso, maus tratos ou ações que vão contra os direitos da criança e adolescente. Lembrando que toda denúncia deve estar embasada no bom senso. “Temos casos de denúncias infundadas, com objetivo de vingança que acabam atrapalhando nosso trabalho”, disse. As denúncias podem ser feitas pelos telefones 3344-2911 ou 9170-0372, a qualquer hora.

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