De repente uma doença sem cura ou sintomas que os médicos não conseguem explicar. Tratamentos convencionais sem resultados. O desespero é tamanho que todas as possibilidades de cura são adotadas. O diagnóstico certo, o tratamento rápido, sem custo e, na maioria das vezes sem cortes, surge como um "milagre". Centenas de pessoas de Tapejara e região têm recorrido ao método através do médium Marlon Santos, que atende aos sábados em Cachoeira do Sul. Cerca de oito ônibus lotados saem, nos finais de tardes de sextas-feiras, levando pessoas obstinadas pela cura. O local vira um pronto-socorro movimentado. Ninguém sabe explicar ainda o que acontece. O certo é que raramente alguém que esteja desenganado pela medicina tradicional, depois de passar por esta enfermaria, vai embora sem pelo menos uma esperança de cura.
O médium, que também atua na área política onde exerce o cargo de deputado Estadual pelo PDT, atende até 4 mil pessoas, num barracão improvisado. O ritual inicia com uma palestra, onde as pessoas recebem orientações práticas e são convidadas a se concentrarem na cura individual. Em seguida, são organizadas filas por ordem de chegada, priorizando aqueles que vão de ônibus. Rapidamente as pessoas passam pelo médium Marlon, que pega no pulso e olha nos olhos de cada um enquanto ouve a queixa do "paciente". Alguns recebem a informação de que já foram curados durante a palestra; outros são encaminhados aos médiuns assistentes que os colocam em macas ou cadeiras a ali procedem com os rituais de cura; em outros é realizada uma cirurgia (com corte) no local de atendimento; e ainda há aqueles que são informados sobre o dia e a hora em que serão operados em casa. Para isso devem obedecer um cronograma.
O empresário Luis César Oliboni sentia fortes dores nos pés, que se acentuavam à noite. Procurou por atendimento médico, mas não obteve nenhum diagnóstico. Foi então que resolveu agendar uma viagem para Cachoeira do Sul. "Além da busca da cura fui também para incentivar meu pai, que tem problemas de saúde. Confesso que também queria ver para crer", disse. Na consulta espiritual, Oliboni foi informado que seria operado dentro de dois dias. Para isso precisava vestir roupas brancas e se deitar às 21h40 sobre lençóis claros. Também teria que manter uma dieta durante três dias, com restrição a alimentos escuros ou gordurosos. "Fiz tudo que mandaram, mas não resisti aos três dias de cuidados alimentares", conta. As dores diminuíram, mas ele não acredita que tenha sido curado. Seu pai também não recebeu a cura.
No mesmo dia em que recebeu um diagnóstico de cirurgia na medicina convencional, o pedreiro Duílio Carminatti procurou o atendimento espiritual. "Me preparei para este momento. Não fui somente com o objetivo de receber a cura de uma hérnia, mas também para um resgate da fé. Orei, pedi e agradeci. Por isso acredito que fui curado", disse.
Duílio conta que recebeu atendimento de um médium assistente de Marlon. Durante os três dias seguintes à consulta ele tomou todos os cuidados sugeridos com alimentação e repouso. "No dia seguinte ao atendimento senti dores no corpo, como se tivesse realmente passado por uma cirurgia hospitalar", frisou.
O pedreiro voltará ao médium no prazo de 30 dias, conforme recomendado. "Meu problema de saúde foi resolvido, mas sobretudo passei por uma cura da mente", frisou.
A medicina e a fé
A fé pode ajudar a curar doenças? Os dados científicos disponíveis -que não são muito numerosos nem estão isentos de controvérsia- sugerem que a resposta é um "sim". A crença parece ser capaz de promover o bem-estar do paciente e ajudá-lo a enfrentar com mais sucesso uma enfermidade, mas efeitos miraculosos difíceis de provar.
O médico Demétrio Valdívia é enfático ao afirmar que não existe cura do corpo, sem cura da alma. "Entre os povos vimos que os orientais trabalham ou exercem a espiritualidade muito mais que os ocidentais. No ocidente a materialidade venceu a espiritualidade e isso faz com que as pessoas fiquem mais doentes. Precisamos dar atenção à nossa espiritualidade", disse.
Porém, ele deixa claro que não concorda com a prática das cirurgias espirituais aplicadas pelos médiuns. "Isso a medicina classifica como charlatanismo", frisa. Diz ainda que uma pessoa que não cursou a faculdade de medicina não pode operar um paciente ou dar diagnóstico. Ele atribui a busca desenfreada por este tipo de tratamento à carência das pessoas, que precisam de um direcionamento de fé. "Este trabalho passa a ser uma autossugestão". O médico concorda que muitas vezes as pessoas estão doentes da alma e desenvolvem sintomas diversos. "Aí muitas vezes surgem pessoas com um desenvolvimento espiritual mais avançado que se beneficiam disso para persuadir os outros", explica. Demétrio diz que não tem conhecimento de nenhum paciente seu que tenha procurado a cirurgia espiritual e retornado curado.
A reportagem do Novo Tempo entrou em contato com a assessoria do médium Marlon Santos a fim de realizar uma entrevista; as perguntas foram enviadas por e-mail mas até o fechamento da edição não obtivemos resposta.